Conversamos com o preparador físico Juninho Brilhante* a respeito dessa função no futebol.
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Quais são as atribuições do preparador físico no futebol moderno?
Caberá ao preparador físico dentro de uma comissão, a responsabilidade pelo olhar direcionado a dimensão física do jogo. No cenário atual, não se pode mais conceber o entendimento da vertente física, dissociada das demais vertentes (técnica-tática-psicológica). Para tanto, sua atribuição é olhar para o jogo, entendendo as solicitações físicas que este traz, e preparar seus atletas para essas demandas.
Qual a formação necessária para exercer essa função?
A formação deverá ser á nível superior, geralmente na graduação em Educação Física (bacharelado), bem como a formação em Esportes (Curso oferecido pela Escola de Educação Física e Esporte da USP) e Ciências do Esporte (Curso oferecido pela Faculdade de Ciências Aplicadas da UNICAMP). Contudo, apenas a graduação não fornecerá os conhecimentos necessários para a pratica da profissão, se fazendo necessários cursos de pós-graduação (latu senso – especialização e/ou Strictu Senso – Mestrado/Doutorado), haja visto a complexidade das ciências que abrangem o treinamento de atletas.
Como está a formação dos profissionais de preparação física no Brasil com relação aos principais mercados europeus?
Penso que o preparador físico no Brasil não está atrás dos profissionais que atuam no mercado europeu. Na minha opinião, o que difere é a cultura futebolística. Na Europa, os treinamentos tendem a ser contextualizados a concepção de jogar que cada equipe busca, otimizando ganhos físicos-técnicos-táticos-psicológicos. No Brasil, ainda estamos em transição ideológica, o que ainda nos leva a treinamentos descontextualizados a forma de jogar. Pensamos ainda nas capacidades físicas, tirando-as das exigências do jogo. Nosso calendário competitivo já não nos permite mais conceber a preparação de atletas sobre esse paradigma.
Em função da mudança de alguns aspectos na preparação física atual, como treino funcional, treinamento de CORE e outros, como você vê a relação do trabalho físico com e sem bola, integrado com o trabalho técnico/tático?
O treinamento funcional e ativação de CORE vai além do modismo que ganhou destaque atualmente. Ele deve atender a concepção a que se propõe (otimizar a função) e estar de acordo com as possibilidades de cada atleta. Do que me adianta colocar o atleta em base instável e fazê-lo agachar, pensando estar ativando um mecanismo sensório-motor, se eu não considerar o padrão de movimento com que meu atleta executa tal ação? Será que ele tem uma boa resposta do complexo póstero-lateral do quadril (glúteo) a fim de estabilizar os joelhos? Há de ter cuidado… Acredito que os treinos funcionais se inserem dentro de um ciclo de treinamento para assessorar o atleta a ajustar desequilíbrios e disfunções que a própria modalidade nos traz (assimetrias funcionais). Quanto aos treinamentos com bola, integrados aos objetivos técnico/táticos, acredito ser esta a função do preparador físico. Conhecer o jogo, estar em sintonia com os pensamentos do treinador, compreender os pormenores do seu grupo de atletas, e em cima disso, preparar para o jogo, através do jogo. Existem inúmeras metodologias que concebem a preparação desportiva sobre esse ponto de vista. A que mais me agrada é o Modelo Cognitivista proposto por Paco Seiru Lo, dos Microciclos estruturados. A concepção da dimensão física de forma integrada da Periodização Tática é bem lógica e me agrada, apesar de algumas ressalvas a sua concepção ideológica. Não concebo a preparação física que não prepare para o jogo.
O preparador físico pode acumular o trabalho do fisiologista ou já se pode considerar uma função indispensável no esporte?
Não acredito em acumular funções pois o fisiologista hoje é de extrema importância no cenário atual do futebol. A quantidade de variáveis e informações sendo coletadas em tempo real, sobre respostas autonômicas (variabilidade da FC), número de acelerações e desacelerações por unidade de treino e jogos através de GPS, respostas bioquímicas frente a treinamentos e jogos, não permitiria o acúmulo desta função por parte do preparador físico. Acredito sim que, o preparador físico, deva ter conhecimento aprofundado em fisiologia, para saber interpretar a quantidade de informações coletadas, saiba discutir com alto nível de profundidade com o fisiologista, para ter assertividade nas suas tomadas de decisão, no intuito de ajudar o treinador, a equipe e atletas.
Qual a importância do preparador físico nas categorias de base? Como esse profissional pode atuar na formação de atletas?
Não sei se deixei exposto entrelinhas meu pensamento em respostas anteriores, mas acredito que, o preparador físico é o profissional dentro de uma comissão, que maior acesso a ciência tem (ou deveria ter), sendo esta (ciência), responsável por conduzir as tomadas de decisão deste profissional. Não concebo que um profissional que trabalhe com jovens atletas nas categorias de base, não saiba sobre os processos de crescimento e desenvolvimento de jovens. Não compreendo clubes que fazem processos seletivos com preparadores físicos que não saibam com profundidade as fases de desenvolvimento motor. A importância do preparador físico nas categorias de base é de suma importância na formação atlética de qualquer indivíduo. Sou da opinião que bons salários deveriam ser pagos para profissionais que militam nas categorias de base, assim como defendo que estes profissionais deveriam ter alto nível de especialização em formação de jovens atletas.
Como você vê o mercado atual da preparação física no futebol, com relação a oportunidades e remuneração?
O futebol em nosso país é um âmbito fechado. Isso tem mudado atualmente, com clubes que abrem espaço para estágios, através de parcerias com universidades. Parcerias assim criam oportunidades para aqueles que querem se inserir no mercado. A remuneração ainda é nosso gargalo. Nossa carreira é diferente de outras carreiras em que a remuneração é linear. Não. Nossa curva é exponencial. De repente, uma grande oportunidade aparece e a remuneração dobra, contudo, necessita tempo e trabalho.
Qual a sua visão sobre o futuro da preparação física no Brasil?
Vejo um cenário favorável para futuro. Sou idealista e tenho visto outros tantos amigos, colegas de profissão e formadores de opinião se engajarem na busca de mudança. Enfrentamos uma crise em nossa escola futebolística e seremos nós, idealistas que iremos propagar essa mudança. A transição de geração, a necessidade de mudança tem favorecido esse cenário.
Quais dicas você daria para quem quer ingressar nessa área? Existe um caminho a seguir?
Sim, existe um caminho a seguir… Este caminho é longo, tortuoso, as vezes sujo, feio e desmotivante. Contudo o amor ao jogo, a vontade de querer fazer mais, melhor e diferente do que muitos fizeram me move. Como combustível para a caminhada sugiro o conhecimento, a atualização e a busca constante, a humildade em sempre querer aprender mais, perseverança quando tudo parecer perdido, além de uma fé inabalável em querer chegar. Como aliados na trajetória, sugiro as amizades boas e verdadeiras, aquelas sem interesses. O trabalho pautado na honestidade, a ética e o respeito a tudo e a todos. Este é o meu caminho, espero que nele você possa enxergar algum exemplo de como traçar o seu. Boa sorte na caminhada e espero nos encontrarmos.
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*Wanderley Brilhante Junior (Juninho Brilhante) é formado em Educação Física Licenciatura Plena pela PUC-Campinas; Pós-graduado em Fisiologia do Exercício pela UNIFESP/EPM; Pós-graduado em Treinamento Desportivo pela Gama Filho/SP; Membro da Escola da Saúde, Faculdade de Educação Física, GEPEDESCA (Grupo de Estudos e Pesquisas em Desempenho Esportivo e Saúde na Criança e Adolescente) USCS – Universidade Municipal de São Caetano do Sul; Preparador Físico da Seleção Brasileira de Futebol Feminino (Categoria Sub-20); Preparador Físico do Desportivo Brasil (Categoria Sub-20); Passagens pelas categorias de base do Sport Club Corinthians Paulista (2008-2010), A.A. Ponte Preta (2014), Guarani Futebol Clube (2004-2005); Passagens pelas equipes Profissionais Audax RJ (2015); ASA Arapiraca(2014); Audax SP (2013-2014); Grêmio Esportivo Osasco (2011-2013).
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Grande Juninho, a pouco tempo venho o acopanhando e vendo suas postagem e compartilhamento, agora vendo essa entrevista tenho certeza que seja um grande capacitador de atletas, suas ideologias são maravilhosos e bem claras.
Creio que chegara aos grandes clubes europeus almentando cada vez mais sua capacidade profissional.
Obrigado pela resposta e votos amigo. Conte comigo sempre. Deus o abençoe.