ENTREVISTA ANDREW PARSONS – ESPORTE PARALÍMPICO

Entrevista com Andrew Parsons, presidente do Comitê Paralímpico Brasileiro e membro do Conselho Executivo do Comitê Paralímpico Internacional.

Você acredita que os grandes eventos que serão realizados no Brasil alavancarão os investimentos no esporte paralímpico?

É o que projetamos. A curva crescente de investimentos no Esporte Paralímpico, que hoje ocorre graças aos resultados positivos alcançados pelos nossos atletas, culminará com a realização dos grandes eventos esportivos no Brasil e tornarão o esporte paralímpico oportunidade evidente de investimento.

 

O Brasil está entre as grandes potências mundiais nos Jogos Paralímpicos. A que se deve esse fato?

Planejamento e gestão eficiente. O Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB) tem feito investimentos acertados no que diz respeito ao desenvolvimento técnico-esportivo, ciência do esporte, comunicação e administração. Em articulação com as Confederações Paralímpicas Brasileiras, tais investimentos têm resultado em mais e melhores atletas em todas as modalidades. O CPB tem um planejamento estratégico e um ‘business plan’ bastante arrojado e detalhado até 2016. Sabemos exatamente aonde queremos chegar e os caminhos pelos quais queremos chegar lá. Com base nisso, criamos os programas e projetos que pensamos que nos levarão a atingir estes resultados. A combinação disso tudo chamamos de “conceito de teia de aranha”. Cada programa que implementamos se conecta com uma série de outros programas, criando diversas opções para o “caminho do atleta”, desde o fomento e categorias de base até o pós-carreira, passando pelo altíssimo rendimento.

Como você vê hoje o mercado do marketing esportivo relacionado ao esporte paralímpico no Brasil?

Perto do potencial que tem, o Esporte Paralímpico ainda é pouco explorado e mal aproveitado pelo mercado. Faltam percepção e conhecimento sobre as oportunidades que o Esporte Paralímpico brasileiro pode representar. Qual outro investimento pode criar associações tão evidentes com valores como performance, superação, coragem, vitória, inspiração; aliando o marketing esportivo e a responsabilidade social corporativa a um Brasil vencedor, apesar da adversidade? Só o Esporte Paralímpico.

 

Quais as grandes dificuldades em buscar patrocínios em empresas privadas?

Penso que ainda falta às empresas privadas o entendimento de como ativar seu patrocínio de forma a tornar o esporte algo que realmente possa ter impacto positivo no resultado de seu negócio. Não basta colocar o nome de sua empresa no uniforme de um atleta ou como patrocinador oficial de uma confederação ou evento. São necessárias diversas ações planejadas para ter resultado. Dessa forma, por não entender bem o mercado esportivo, muitas empresas limitam seu investimento nessa área. E o Movimento Paralímpico por ser ainda subestimado tem ainda mais dificuldades. Mas isso está mudando: algumas empresas de visão já estão percebendo as oportunidades e se associando ao nosso segmento.

 

Em termos de organização e investimento o Brasil está muito longe dos Estados Unidos, China e Europa?

Em termos de organização esportiva sim. Ainda não há uma clara definição de papéis dos diferentes agentes envolvidos no esporte brasileiro: os três níveis de governo, escolas, universidades, clubes sociais, ONGs, iniciativa privada, federações, confederações e comitês. Isso faz com que não haja sinergia nas ações. Consequentemente, perde-se o foco do investimento naquilo que é realmente importante e muitas vezes há duplicidade de esforços e retrabalho. É preciso criar esta clara definição de papéis e estratégias para que possamos aproveitar melhor os recursos financeiros e humanos envolvidos no meio esportivo brasileiro.

 

Quais as principais dificuldades encontradas pelo Comitê Paralímpico Brasileiro?

Existem dificuldades em vários níveis. Em termos de financiamento, praticamente todos os nossos recursos têm origem pública, seja em nível municipal, estadual, federal ou empresas estatais. A administração desses recursos exige uma série de trâmites e um nível de reporte que compromete nossa agilidade e, algumas vezes, a busca pela qualidade. Se contássemos com mais recursos privados, teríamos uma gestão ainda mais eficiente e melhores resultados. Além disso, apesar de termos incrementado bastante nosso orçamento e atraído parceiros, a base do Esporte Paralímpico ainda carece de recursos, como os clubes, federações e confederações.

Nos últimos grandes eventos a mídia começou a cobrir os jogos, como você acha que a mídia poderia ajudar ainda mais na divulgação do esporte paralímpico?

Isso foi fruto de uma estratégia de longo prazo do próprio CPB. Em Atenas 2004, nós compramos os direitos de transmissão dos Jogos Paralímpicos e sublicenciamos gratuitamente a 13 redes de TV. Além disso, custeamos a passagem aérea, acomodação, alimentação, transporte terrestre, satélite e disponibilizamos uma competente equipe de produção, incluindo cameramen. Dessa forma, tiramos completamente os custos para as redes de televisão que só tiveram que permitir que seus repórteres fossem a Atenas cobrir os Jogos. Sabíamos que tínhamos um bom produto que precisava maximizar sua exposição. Foi um investimento de retorno fantástico, pois tivemos o que até então era o recorde mundial de transmissão das Paralimpíadas com 168 horas e uma cobertura jornalística muito intensa. Repetimos essa estratégia nos Jogos Paralímpicos de Pequim 2008, nos Parapans de 2007 e 2011 e em diversos campeonatos mundiais, principalmente de atletismo e natação. Em 2012, finalmente chegamos aonde queríamos. Para Londres, pela primeira vez uma televisão comercial, a TV Globo, pagou diretamente pelos direitos de transmissão, percebendo o potencial do evento. 

Para aumentar o fomento ao esporte paralímpico, além do poder público, quais instituições poderiam apoiar e como?

A iniciativa privada poderia ter um papel mais relevante no fomento do Esporte Paralímpico. Com mais recursos seríamos capazes de desenvolver mais atletas desde a base até o alto nível. Mas não apenas no CPB, mas também nos clubes e confederações. Também percebo grande potencial nas universidades, no que diz respeito à pesquisa e formação de recursos humanos. Aliás, já trabalhamos com algumas delas, principalmente as públicas, em nosso programa chamado Academia Paralímpica Brasileira. Neste segundo semestre de 2012 estaremos empreendendo algumas iniciativas para agregar a este projeto mais universidades públicas e universidades particulares, onde há muito potencial. 

 

Você vê ainda certo preconceito com o para-atleta?

Acho que estamos num outro momento, em que é impossível não perceber um atleta paralímpico como atleta de alto rendimento. Penso que existe este reconhecimento. Entretanto, muitas vezes não estamos no topo da agenda de alguns administradores públicos, iniciativa privada e da sociedade em geral. Isso faz com que percamos algumas oportunidades. Mas evoluímos muito nos últimos dois ciclos. Hoje existe muito menos preconceito.

 

Quais as principais metas para o Comitê Paralímpico Brasileiro nos próximos anos?

Como a maioria do nosso financiamento é público, penso que nossas metas também devem ser. Por isso, nosso planejamento estratégico é divulgado bem como nossas metas: melhorar do 9º lugar em Pequim, para o 7º em Londres e 5º no Rio, em 2016. Também queremos manter nossa hegemonia em Jogos Parapan-americanos, já que nas edições de 2007 e 2011 ficamos em primeiro lugar geral. Existem outras metas ainda mais ousadas, mas de difícil mensuração. Uma delas é universalizar as oportunidades esportivas para todas as pessoas com deficiência. O esporte é uma ferramenta eficaz de inclusão social, educação e saúde. E isso não é diferente para as pessoas com deficiência. Assim, é fundamental que as crianças com deficiência tenham acesso à atividade física orientada na escola.

Como deveria ser a formação de um profissional que deseja atuar com o esporte paralímpico?

Nada diferente daquela de um profissional que deseje trabalhar com qualquer outro tipo de movimento esportivo. Isso é fundamental. Tratamos de esporte. Sabemos do efeito social que o Esporte Paralímpico desencadeia, mas só conseguimos atingi-lo focando no alto rendimento. Aí vai depender da área de atuação do profissional. Obviamente temos muitos profissionais das áreas científicas, de saúde e de educação física lidando diretamente com os atletas no dia a dia. Já na gestão temos profissionais de diversas áreas como administração, marketing, comunicação, economia etc. Entretanto, o esporte é um mercado que vem se desenvolvendo de forma muito rápida e intensa. É importante estar atualizado, principalmente no que acontece em nível internacional. Temos profissionais do esporte nos quais investimos em sua formação e também profissionais de outras áreas, com MBAs e especializações, nos quais temos que aculturar ao esporte.

Fonte: Revista Gestão no Esporte. Ano I. Edição 3. 2012