Nessa entrevista falamos com o ex-atleta profissional e gestor esportivo César Sampaio*.
O que acha do mercado de gestão esportiva no Brasil? Estamos muito longe do mercado europeu?
Não é uma questão de estar perto ou longe, cada país possui sua identidade e seu modelo próprio de gestão. Acredito na continuidade de um modelo ético, profissional, transparente, honesto e dinâmico, onde os processos metodológicos são revisados a cada término de ciclo. Esses processos são aperfeiçoados quando alcançam suas metas e corrigidos quando as metas não são alcançadas. Além disso, devemos gerir os clubes para os torcedores, associados, simpatizantes, admiradores e todos profissionais que estão de maneira direta ou indireta envolvidos no espetáculo.
Quais as grandes dificuldades que você vê na área e o que fazer para mudar esse quadro?
Muitos clubes ou entidades de administração ainda são administrados de forma política, amadora ou corrupta, atendendo assim os interesses dos seus administradores.
Entendo estarmos em um momento importante e oportuno para mudanças.
O profissionalismo e a meritocracia no processo de seleção de pessoas para cargos administrativos, são medidas emergenciais a serem aplicadas se pensamos em uma reestruturação nos clubes e nas entidades de administração do futebol brasileiro.
Quais as principais práticas de governança corporativa que você viu e vivenciou no esporte brasileiro?
Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC, 2009, p. 19) define que a “Governança Corporativa é o sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre proprietários, Conselho de Administração, Diretoria e órgãos de controle”. Portanto, as práticas de Governança Corporativa (GC) se aplicam a qualquer organização, independente de porte, controle ou personalidade jurídica. Os princípios de GC são: transparência, equidade, responsabilidade.
O texto acima traduz de maneira direta e objetiva os pilares de Governança Corporativa.
Usando esta narrativa, feche os olhos e pense qual clube brasileiro atende os requisitos acima mencionados?
A qualidade do futebol que é praticado hoje no cenário nacional, está diretamente ligada a maneira como estamos administrando os clubes e as entidades de administração do futebol brasileiro.
Qual a formação necessária para exercer essa função?
Depende do trabalho que você pretende exercer.
Creio que para um gestor o curso de administração com especialização no futebol ou no esporte, é uma disciplina indispensável.
Indico também os cursos de gestão de pessoas, gestão de crises, gestão financeira, planejamento estratégico e um curso de inglês.
Você acha que as faculdades e cursos de gestão estão prontos ou preparados para formarem novos gestores no Brasil? O mercado está pronto para aceitar esses profissionais vindos das faculdades?
Acho que temos excelentes cursos formando profissionais interessantes na área de gestão. O problema aparece na grande dificuldade de aceitação e encaixe desses profissionais no mercado, e quando contratados pelos clubes, são obrigados a cumprir ordens de superiores amadores, apaixonados, corruptos e políticos.
Você acha que a experiência dentro de campo de um ex-atleta profissional é suficiente para assumir um cargo na gerência de um clube de futebol?
O fato de ser um ex-atleta pode contribuir para o entendimento e prática da função, mas os pilares acadêmicos são alicerces sólidos na construção de um modelo ou método.
Qual a sua visão sobre o futuro da gestão no futebol brasileiro?
Muito otimista. Os clubes e os torcedores não aguentam mais serem tratados com desrespeito e serem enganados.
A própria legislação está em processo de mudança.
O que diz a Lei nº 13.155/2015:
Deveres dos clubes
– Publicarem demonstrações contábeis padronizadas e auditadas
– Pagar em dia as obrigações tributárias, trabalhistas e direito de imagem
– Investir no máximo 80% da receita bruta com futebol
– Manter investimento mínimo e permanente nas categorias de base e no futebol feminino
– Respeitar as regras de transparência da Lei Pelé
– Não antecipar receitas previstas para mandatos futuros a não ser em caso de situações específicas
Estabelece princípios e práticas de responsabilidade fiscal e financeira e de gestão transparente e democrática para entidades desportivas profissionais de futebol; institui parcelamentos especiais para recuperação de dívidas pela União, cria a Autoridade Pública de Governança do Futebol – APFUT; dispõe sobre a gestão temerária no âmbito das entidades desportivas profissionais; cria a Loteria Exclusiva – LOTEX; altera as Leis nos 9.615, de 24 de março de 1998, 8.212, de 24 de julho de 1991, 10.671, de 15 de maio de 2003, 10.891, de 9 de julho de 2004, 11.345, de 14 de setembro de 2006, e 11.438, de 29 de dezembro de 2006, e os Decretos-Leis nos 3.688, de 3 de outubro de 1941, e 204, de 27 de fevereiro de 1967; revoga a Medida Provisória no 669, de 26 de fevereiro de 2015; cria programa de iniciação esportiva escolar; e dá outras providências.
Quais dicas você daria para quem quer ingressar nessa área? Existe um caminho a seguir?
Alguns pontos:
– Gostar de resolver problemas: “Quem desliga o telefone quando acontece um problema ou dá uma merda, não serve para ser gestor”. Frase do José Luiz Portella, idealizador do Curso de Gestão de Esporte na Universidade São Marcos em 2005.
– Estar em constante aprendizado e ser interdisciplinar.
– Ser organizado.
– Fazer uma boa gestão do tempo.
– Ser honesto, ético, sincero, justo, ágil na tomada de decisão, verdadeiro, equilibrado em momentos de conflito, ambicioso e prudente.